sábado, 16 de maio de 2009

REVELAÇÃO MAIOR

a roupa estava estendida no arame.
mas. mas. mas.
mas fora estendida por j. azevedo e silva,
que o mesmo é dizer:
erradamente estendida.

«isto é realmente um poema?»,
inquire, na sua candura fatal, a amiga do poeta:
«que faz disto um poema?».
com um raio, amiga:
de facto, que faz, disto, um poema?

«as camisas»,
explicava a sra. dona azevedo e silva ao sr. azevedo e silva,
«as camisas não se dependuram pelas pontas,
«os lençóis estão a tocar no chão,
«não pode ser, não pode ser, não pode ser.
«as cuecas têm de estar todas juntas, deste lado,
«e as roupas da menina ficam aqui.
«não gosto de molas de cores diferentes.»

há razões para além do entendimento de j. azevedo e silva
nesta matemática da roupa estendida.

porventura,
o sentido mais frágil e mais forte do universo
repousa no segredo pitagórico da roupa bem estendida.
j. azevedo e silva não tem a menor suspeita,
pobre não-iniciado,
das inversões de ciclos e cataclismos,
das culpas e malefícios tremendos
que advirão em virtude da sua tarefa erradamente cumprida.

e se falo das razões mais obscuras do universo,
à beira de uma revelação que por um pouco se não revela,
não posso crer que só por um pouco não fiz um poema?

Sem comentários:

Enviar um comentário