sexta-feira, 16 de abril de 2010

desalmados

atravesso, em corrida, o centro da vila, e não há senão a noite e eu,
e saio por uma das artérias, quando os vejo vir, e já me viram,
vultos malditos,
faço, sem abrandar o passo, uma meia volta mal feita,
embatendo, sem querer, em paredes e portões, acordando os cães dos donos,
que me arreganham os seus nervos, saltando contra o gradeamento,
as vozes enlouquecidas mordendo a noite aos bocados,
tento sair por outra artéria, mas descubro nela um mendigo
tossindo e praguejando,
não posso expô-lo,
eu corro, eles não, mas aproximam-se perversamente de mim,
tento uma nova artéria, como se estas artérias fossem tentáculos
ou pontas de estrelas ao redor do centro,
mas vejo um polícia encostado a uma haste de luz,
e também não posso atraí-los ao polícia, que me não salvaria,
circundei já o centro todo da vila, de artéria em artéria, entre portas fechadas,
a última artéria está bloqueada por um enorme carro de obras,
sinto-os cadenciamente próximos, eu correria ainda, mas sem ter para onde,
não posso mais.

estaco; volto para eles o meu peito arfante e mortal: resta-me enfrentá-los,
sem outras armas que não os ossos e o desespero do meu corpo.

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